Saturday, May 09, 2009

Conversa Franca

Deixei que ela agisse o tempo que quisesse. Pude perceber que a Gárgula estava matando apenas dois tipos de presas. Um dos tipos era os mesmos que eu caçava, portanto ela estava me ajudando sem saber desse fato e o outro tipo...
Bom.. A criança de oito anos que ela matou no dia 13 de fevereiro, era inocente até que se provasse o contrário.
Essa era a motivação de Anderson contra a minha pessoa, alegando que eu estava traindo Geburah, que eu estava voltando às minhas origens de avatar do Arcanjo dos necromantes e que se assim eu continuasse, ele teria que me enclausurar no lugar de onde eu jamais deveria ter saído.
Minha alegação foi bastante simples. No mundo em que vivíamos de avatares da Justiça acima de tudo, até mesmo a criança aparentemente inocente, era um verdadeiro potencial contra outras pessoas inocentes.
Lembro de seu atordoamento, ao que Jean defendeu minhas palavras.
- “Jamais pensei que justo você trairia Geburah, O’Toole”.
O meu escudeiro em sua resignação preferiu se silenciar, ele carregava nas costas a dor contida pela perseguição católica aos atos pagãos.
- Não o culpe Anderson... Ele também possui seus motivos para cruzar os braços nesse caso em específico. Dê-me alguns meses a mais de mortes causados pela gárgula e eu mostrarei que no fundo, até mesmo ela segue os preceitos de Geburah, ou não percebeste o quanto o Arcanjo da Justiça tem andado silencioso?
Ainda posso me lembrar da resignação de Anderson, pois ele sabia o quão fortes tinham sido as minhas palavras.
A cidade estava para eclodir em sua verdadeira caça as bruxas, quando eu a encontrei mais uma vez, em um momento em que ela estava frágil, ferida, depois de uma batalha contra demônios libertos de meus sonhos.
- Cansada? – Murmurei, pouco depois de soltar o trago de um cigarro.
- Grrrrrrr!!! – Aquela voz, depois de meses voltava a surgir aos meus ouvidos. Eu estava em desvantagem, por mais que meu corpo se regenerasse rápido, eu podia sentir o cheiro do ferro frio impregnado em alguma arma que ela carregava, escondido sob o capote naval que ela usava.
Ela me olhava com aqueles olhos de fera. Uma criatura bestial em forma humana, que me encarava, deixando claro que ela poderia me matar naquele exato momento, mas, no entanto, ela permanecia ali, parada, a me espreitar.
- O que queres? Por que não findas de vez o assunto pendente entre nós duas? – Rosnei para a inquiridora.
Ri de modo abafado. Era engraçado em certo ponto ver a gárgula me provocar daquele jeito. Sim.. Eu poderia encerrar o assunto ali.
- Você é apenas uma vítima do acaso. E nós duas sabemos que você tem um padrão que a mantém presa ao seu código de honra.
- O que queres de mim? – Vociferei. Mas a inquiridora permaneceu ali a sorrir, esperando o momento que eu desse meu passo errado.
- O verdadeiro nome daquela que te criou. Matando-a, eu estarei te libertando. Liberdando-te, eu poderei verificar até onde você é inocente ou culpada em toda essa história.
O quê? A Inquiridora não me matou até hoje por perceber meu elo com minha criadora?
- GRRRRR!
- Você tem dúvidas também. Pude observar seu conflito interno todo esse tempo. Não me basta saber que sua criadora é uma Morgan.
Meu corpo tremia, eu podia sentir toda a fúria se espalhando pelos meus nervos. Eu teria que defender minha criadora contra a Inquisidora e no entanto, mesmo aquela predadora me falando naquele momento o que pretendia fazer e deixando claro, que também me caçaria futuramente, eu não conseguia ir contra ela. Ela não era uma McArthur, não estava instigando uma luta fisicamente.
- Todos acabam se tornando marionetes e muitas vezes agimos desta forma por tomarmos gosto pela morte. Pelo cheiro do sangue, pelo prazer de ceifar vidas... Pela fuga de nossas mentes, por achar que assim... tudo se torna mais fácil... Preferimos nos isolar do mundo e das pessoas que se importam conosco... E quando as únicas pessoas que nos vêem mais que meros monstros e marionetes se ferem... Nos culpamos por estarmos de mãos atadas.
As palavras dela chegavam aos meus ouvidos, penetravam meu corpo pétreo. Ela tentava humanizar um monstro como eu. Quem era ela para dizer algo? Ergui meus olhos injetados de ódio, mas ela havia saído, me deixando com mais conflitos internos. Que era ela afinal?

2 comments:

Camila Muniz said...

Antes de tudo notei que você agora escreve meu nome com dois "L", e esclarecendo por que fechei o Lorraine... Bom, resolvi trancafiá-la na torre mais alta do reino. Por enquanto ela será um projeto que ninguém poderá acompanhar, como desde o começo eu decidira assim...

Sobre o texto... Nunca tive tanta vontade de ler o Alice como hoje, talvez seja até um sinal. Novamente percebo o quanto pode ser forte um laço. Só não entendo ainda que valor tem essa Gárgula para Alice. Se bem a conheço, pelos textos que leio, ela não hesitaria em matar a criatura. Será que ela conseguirá provar que ela é inocente? Em quanto se medirá a força da Morgan? Me lembre de ler o próximo texto!

Samuel Medina (Nerito Samedi) said...

Confesso que não entendo essa gárgula... às vezes ela parece realmente mais humana que a própria Alice. E eu sempre imaginei gárgulas menos humanos que qualquer coisa.
Agora, uma pista. A gárgula caça MacArtur's. Seria alguma questão de inimizade de famílias? E será que Alice não está apenas manipulando a criatura? Não sei se você já ouviu falar do mito do golem, mas essa gárgula parece um ser que, ao saber-se criado por um humano, esforça-se tanto em tornar-se humano que acaba esquecendo (ou abandonando) os propósitos para o qual foi criado...
Mas será que os humanos também não fazem isso? Esforçando-se tanto em tornar-se como seu Criador que esquecem o propósito(?) para o qual foram criados.

Cara amiga, novamente peço desculpas por ausentar-me durante tanto tempo. Aguardo o desfecho dessa narrativa, esse confronto psicológico entre Alice e a gárgula. Abraços!